José Sá Fernandes acusa Estamo de ter andado a vender direitos de construção ilegítimos

Por Ana Henriques in Público

O vereador dos Espaços Verdes da Câmara de Lisboa, José Sá Fernandes, acusa a imobiliária de capitais públicos Estamo de ter andado a vender terrenos com a promessa de direitos de construção superiores aos autorizados pelo Plano Director Municipal.
Questionado sobre os motivos que terão levado o presidente da autarquia, António Costa, a assinar em Maio passado um protocolo com a Estamo sem disso dar conhecimento aos vereadores da oposição, José Sá Fernandes disse que o acordo serviu para "travar o modo inacreditável como a imobiliária estava a actuar em Lisboa": "Vendia a terceiros terrenos com índices de construção fictícios", maiores do que o permitido nos instrumentos de planeamento do território. O vereador dá como exemplo a Quinta das Garridas, em Benfica, caso em que os actuais responsáveis camarários tiveram de negociar com o actual proprietário uma substancial redução dos índices de construção prometidos pela Estamo.
O protocolo assinado por António Costa abre as portas, ainda que indirectamente, à aprovação de dez grandes projectos imobiliários, parte dos quais a Estamo não conseguiu viabilizar no passado. Ao mesmo tempo, o município assegurou a cedência pela imobiliária de quatro dos seus imóveis para escolas e equipamentos públicos.
Enquanto os vereadores da oposição criticam a falta de transparência do processo, Sá Fernandes prefere sublinhar a forma como o acordo permite "salvaguardar alguns equipamentos cujos usos é do interesse [da câmara] que não sejam alterados". É o caso do Convento do Desagravo, na zona da Feira da Ladra, onde a autarquia quer instalar quatro escolas, e do complexo desportivo da Lapa, que corria o risco, segundo o vereador, de ser transformado "numa urbanização toda catita". Para Sá Fernandes, o protocolo não é, no entanto, mais do que "uma troca de intenções", não configurando "compromissos de qualquer espécie por parte da câmara".
"Não considero que a câmara esteja vinculada por este acordo", considerou também o vereador António Carlos Monteiro (CDS-PP), explicando que tanto os loteamentos como os instrumentos de ordenamento do território são matérias não delegáveis: o presidente da câmara tem de as levar à votação, não podendo decidir sozinho sobre elas.
O PÚBLICO tentou, sem sucesso, obter uma reacção da Estamo sobre as declarações de José Sá Fernandes. Também pouco pacífica foi a decisão tomada na reunião de câmara de ontem de atribuir à Trienal de Arquitectura de Lisboa um subsídio de 320 mil euros, a que se junta a cedência de um palacete para o funcionamento dos respectivos serviços. "Apesar da actual situação económica, a câmara continua a entregar dinheiro a rodos a entidades mediáticas", criticou o vereador social-democrata Victor Gonçalves, sublinhando que nas edições anteriores da trienal as subvenções camarárias nunca ultrapassaram os cem mil euros.
Já Sá Fernandes faz outras contas: "A última trienal custou sensivelmente o mesmo que a próxima, porque aos 150 mil euros que foram atribuídos aos organizadores há que somar um montante idêntico entregue à Ordem dos Arquitectos para o mesmo fim. Está a dar-se quase o mesmo dinheiro para mais eventos." Para António Carlos Monteiro, a atribuição de um subsídio deste valor é uma decisão "irracional". O dinheiro será entregue em várias tranches até ao ano que vem, e servirá para financiar os diferentes eventos promovidos pela trienal, que está neste momento à procura de estagiários e voluntários para integrarem o projecto.

Assembleia municipal de fora

Os vereadores do CDS-PP e do PSD defendem que, tratando-se de uma repartição de encargos, o assunto devia ser submetido ao escrutínio da assembleia municipal, mas António Costa não tenciona fazê-lo. "Temos de impedir que estes projectos desapareçam", justificou José Sá Fernandes, congratulando-se por investidores como a revista Time Out, que quer criar um espaço de lazer com restaurantes e discoteca no Mercado da Ribeira, não terem desistido das suas intenções apesar do cenário económico. A transformação de parte do mercado está, no entanto, atrasada, tendo a câmara aprovado ontem o projecto de reabilitação e prorrogado o prazo de execução da obra. O vereador Victor Gonçalves estranhou, no entanto, a forma como o processo está a correr: "Foi tudo feito à revelia dos serviços do urbanismo da autarquia, que não deram nenhum parecer sobre o projecto." A obra deverá ficar pronta daqui a um ano.

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